top of page
Buscar

Capitalismo e saúde mental

  • Foto do escritor: sitenuesde
    sitenuesde
  • 10 de abr.
  • 15 min de leitura

Por Fabrício Maciel



Ilustração: Factotum Cultural
Ilustração: Factotum Cultural

[Texto base de minha apresentação no encontro virtual bianual da HELICA (Healthy Lifestyles & Health Literacy Chair Academy University Program), promovido pela Universidade de Educação de Freiburg (entre 7 e 10 de abril e 5 e 10 de junho de 2025). Uma versão diferente deste texto foi publicada originalmente no site Outras palavras, em 16 de setembro de 2022, sob o título “O executivo e a patologia da normalidade”].


(English bellow)


Boa tarde! Eu gostaria primeiramente de agradecer aos queridos amigos Uwe Bittlingmayer e Luis Saboga pelo convite para participar novamente da programação da Helica. No ano anterior, fizemos uma apresentação que foi bastante produtiva e me deixou muito empolgado. Nesta nova ocasião, procurarei dar continuidade à discussão levantada naquele momento, com insights e provocações novas. Tentarei aqui, de maneira simples e objetiva, apresentar uma contribuição sociológica para se pensar a questão da saúde mental na contemporaneidade. Esta contribuição será feita a partir de minhas reflexões e pesquisas empíricas nos últimos tempos.

Para tanto, uma teoria crítica sobre o capitalismo não pode se furtar de diálogos entre seus grandes intérpretes. Por isso, gostaria de esboçar um confronto inicial entre dois grandes autores que muito me influenciaram, um clássico e outro contemporâneo. Estou falando do psicanalista frankfurtiano Erich Fromm e do psiquiatra e psicanalista francês Christophe Dejours, pai dos estudos contemporâneos sobre psicopatologia do trabalho. No geral, procurarei mostrar como o capitalismo contemporâneo é um sistema social, econômico e político montado para produzir insanidade mental em escala coletiva. Nesse sentido, selecionei duas obras centrais destes autores, que considero vitais para uma compreensão sociocultural do capitalismo contemporâneo e de suas patologias fundamentais. Trata-se do livro The sane Society (1955) (Psicanálise da sociedade contemporânea, 1970), de Fromm, e do livro Souffrance en France: banalisation de l`Injustice sociale (1998) (A banalização da injustiça social, 2006), de Dejours.

Meu interesse nestes autores e nestas obras não é por acaso. Nos últimos anos, realizei uma ampla pesquisa teórica e empírica com executivos no Brasil. Minha ideia inicial foi tentar mapear a origem de classe, o estilo de vida e o posicionamento político destes executivos. Com o tempo, constatamos tratar-se de uma “alta classe média” brasileira, com origem social privilegiada, estilo de vida marcado por uma mentalidade profundamente meritocrática e um posicionamento político extremamente conservador, diante da grave desigualdade de classes no Brasil. Este cenário me levou à definição de um “habitus corporativo”, como conceito central para mapear as formas de pensar, agir e sentir de meus entrevistados. O principal produto desta pesquisa foi o E-book intitulado A ficção meritocrática: executivos brasileiros e o novo capitalismo (Maciel, 2022), no qual apresentamos os resultados gerais que encontramos.

Diante de tais resultados e especialmente a partir da leitura da obra de Erich Fromm, comecei a me perguntar, para além do habitus, que tipo de self é este, predominante entre pessoas que, sendo privilegiadas desde o berço, ainda assim se apegam fortemente a uma mentalidade profundamente meritocrática. Neste sentido, o sociólogo alemão Ulrich Bröckling (2007) apresenta algumas pistas interessantes com seu conceito de “self empreendedor”. Um dos aspectos que mais me marcaram nesta pesquisa, para além das evidentes dimensões socioeconômicas, foi exatamente a condição humana dos executivos. Predomina entre eles evidentemente um mal-estar. Esta questão é intrigante, pois estamos tratando aqui de indivíduos que são os principais vencedores do mundo corporativo e do capitalismo como um todo. Teoricamente deveriam ser as pessoas mais felizes e realizadas. Esta não me parece ser exatamente a situação. 

Algo que constatamos, por exemplo, é que os executivos são vistos como e internalizam uma condição de “super-homens”, que precisam aguentar pressão, não demonstrar fraqueza e ser exemplo para seus subordinados. Aqui dialogamos com aspectos específicos relacionados à temática de uma psicopatologia do trabalho, aprofundada como ninguém por Dejours. Neste sentido, passei a compreender que os executivos são as principais “estruturas estruturantes” e “estruturas estruturadas” do capitalismo contemporâneo, ou seja, seu principal suporte de reprodução, se usarmos a linguagem de Pierre Bourdieu. Podemos com isso perceber uma conexão direta com a função que eles vão exercer na construção e na legitimação da dominação social no capitalismo atual. Assim, me parece urgente mobilizar as obras de psicanalistas como Fromm e Dejours. Não por acaso, o papel dos executivos na construção da “patologia da normalidade” (Fromm, 1970) é algo que foi percebido como fundamental na obra dos dois autores. 

Por conta disso, nós podemos esboçar um diálogo entre o que eu gostaria de chamar de uma “antropologia filosófica” do capitalismo contemporâneo, na obra de Fromm, e uma teoria prática da dominação social atual, na obra de Dejours. Com isso, pretendo esboçar uma crítica cultural da dominação social nas sociedades atuais. Compreendo cultura, neste contexto, de maneira diferenciada em ambos os autores. Na obra de Fromm, encontramos uma análise muito mais cultural do que econômica da vida nas sociedades capitalistas. É neste sentido que ele vai “psicologizar” o conceito de alienação de Marx, indo com isso também além de Freud. Para Fromm, a alienação não é apenas falsa consciência e nem condicionada por nossos instintos primitivos, mas determina-se especialmente pela existência social e cultural no capitalismo.

Não por acaso, seu conceito de “caráter social” procura mapear exatamente o tipo humano predominante na cultura capitalista contemporânea, imposto a cada um de nós. A partir de nossa pesquisa, podemos dizer que o caráter social predominante no capitalismo atual é ultrameritocrático, o que ficou claro em várias falas de nossos entrevistados. Neste sentido, é bastante pertinente a obra de Richard Sennett (2015), com sua ideia de “corrosão do caráter”. Com este conceito, o autor procura tematizar a incapacidade de construção de solidariedade e laços duradouros por parte dos indivíduos no que ele denomina como “novo capitalismo”. Não foi outra coisa o que encontramos em nossa pesquisa, ou seja, um individualismo exacerbado e uma crença quase religiosa na meritocracia. Esta realidade corrói o caráter do self corporativo contemporâneo e, ao mesmo tempo, o generaliza como sendo o caráter social exigido de toda a sociedade, se considerarmos a influência sistêmica que o mundo corporativo exerce sobre todas as interações sociais.

Retornando a Fromm, a própria ideia central de patologia da normalidade é de profunda importância para a compreensão da dominação social contemporânea. Para o autor, as sociedades modernas como um todo não são sadias, de modo que não se trata simplesmente de patologias individuais, mas coletivas. Com isso, o que encontramos em nossa pesquisa é que o mundo corporativo, através de seus executivos, constrói e impõe a todos os indivíduos metas morais e culturais quase inatingíveis, causando estresse, depressão e mal-estar em todas as camadas sociais. Para esta reflexão, um excelente livro do francês Alain Ehrenberg se chama, em alemão, Das erschöpfte Selbst (O self esgotado) (2015), onde não por acaso ele dialoga com o frankfurtiano Axel Honneth, que retomou em sua obra o tema das patologias sociais no capitalismo recente. 

Entretanto, a análise de Fromm sobre a cultura do capitalismo permanece em um plano bastante abstrato, que carece de constatações empíricas em diversos aspectos. É aqui que entra como complemento a extremamente importante obra de Christophe Dejours. O autor vem construindo há muitos anos, na França, os campos da psicodinâmica e psicopatologia do trabalho. Sua questão central é a forma como o sofrimento e o medo se tornam uma regra naturalizada nas relações de trabalho como um todo. O autor percebe um aumento considerável da aceitação da injustiça social na França nos anos de 1990, o que ele vai definir como sendo a “banalização do mal”, adaptando aqui a clássica análise de Hannah Arendt sobre o fascismo. Entretanto, Dejours não está tratando da visível banalização do mal em relações autoritárias mediadas pelo Estado, mas sim deste tipo de banalização invisível na vida cotidiana das relações de trabalho. Trata-se, em resumo, da naturalização da desigualdade em nível profundo.

Neste sentido, o autor nos apresenta uma “teoria prática” sobre a patologia da normalidade, nos permitindo ver como as grandes empresas desenvolveram uma verdadeira cultura do medo e do sofrimento, o que é fundamental para a prática da dominação social e a reprodução da desigualdade. Estamos falando aqui de ameaças, terrorismo psicológico, humilhação e desrespeito cotidianos, que vão minando a saúde mental das pessoas. Aqui, podemos compreender cultura em sentido prático, semelhante ao sentido empregado por Richard Sennett em sua análise sobre a “cultura do novo capitalismo”, marcada pela ideologia da flexibilidade e do trabalho em equipe. O que Dejours nos mostra é exatamente o contrário desta ideologia. O cotidiano do mundo corporativo é marcado pela naturalização do sofrimento e do medo, tanto por parte de quem inflige quanto por parte de quem é atingido. Naturalmente, o estrago é bem maior naqueles que se encontram nas camadas inferiores da hierarquia do trabalho, sendo marcados por um cotidiano de agressão e violência simbólica que objetivamente são somatizados em seus corpos.

Para o autor, uma questão central neste sentido é compreender como pessoas comuns, ou “cidadãos de bem”, podem ser coniventes e cúmplices de formas de injustiça inaceitáveis na França em períodos anteriores. No Brasil, a aceitação da injustiça social faz parte de nossa história desde sempre, considerando nossa profunda desigualdade estrutural entre as classes. Um forte exemplo de banalização da injustiça social, como definido por Dejours, pode ser visto nos crimes empresariais cometidos em Mariana e Brumadinho, tratados eufemisticamente pela mídia como “desastres ambientais”. 

Quando alguns dos principais executivos da Vale e da Tüv Süd, empresa alemã de consultoria responsável por relatórios e pareceres sobre a segurança do caso de Brumadinho, foram denunciados por crime doloso pelo Ministério Público de Minas Gerais, as duas empresas procuraram dissociar a sua imagem do crime em questão. Trata-se aqui de uma grave aceitação da injustiça e da banalização do mal. 

Para Dejours, trata-se de “tolerar o intolerável” e da construção da capacidade de aceitação do “trabalho sujo”, muitas vezes realizado pelos altos executivos, que deveriam ser responsabilizados. Em contrapartida, quando tratamos de tais temas com nossos entrevistados, estes desconversam, apresentando um discurso decorado do mundo corporativo em defesa do papel positivo das empresas na sociedade. Com isso, eles constroem um ideal de capitalismo do bem, politicamente correto, inclusivo e sustentável, em um processo de legitimação e justificação do “novo espírito do capitalismo”, conforme a bela análise de Luc Boltanski e Eve Chiapello (2009). 

Na prática, mais uma vez, Dejours nos explica que esta construção de uma grande mentira no mundo corporativo só é possível através do que ele define como “estratégia de distorção comunicacional”, o que vem do alto escalão das empresas e é passado a todos os seus empregados. Ou seja, no interior das empresas se constrói sempre um discurso que melhor preserve a sua identidade, o que quase nunca corresponde à realidade. Esta estratégia também é definida por Dejours como a “racionalização do mal”.

Com isso, o exercício necessário que precisamos fazer, a partir das ideias de Fromm e Dejours, é desnaturalizar a banalização do mal no capitalismo contemporâneo. Este é um passo indispensável para a construção de sociedades sãs, como diria Fromm. Para tanto, é preciso compreender que a banalização do mal é laica, fazendo parte de nossa vida cotidiana comum. Sua construção e legitimação depende diretamente do que, em minha pesquisa, defini como uma “moralidade ultra-meritocrática” defendida e vivida na prática pelos executivos. 

Estes são apresentados para a sociedade como exemplos de sucesso, desempenho e honestidade, o que esconde o envolvimento de vários deles em casos de corrupção e de crimes empresariais. Além disso, a moralidade ultra-meritocrática é um dos aspectos essenciais de amparo à ascensão da extrema-direita em vários países do mundo, inclusive no Brasil. Basta ver os discursos profundamente meritocráticos de Donald Trump e Jair Bolsonaro, entre outros. Desta forma, a desconstrução de todo este pano de fundo moral e ideológico é fundamental para a construção de sociedades sadias, como havia sonhado Erich Fromm em sua utopia humanista, para além das patologias da normalidade.

 

Bibliografia

BOLTANSKI, Luc; CHIAPELLO, Éve. O novo espírito do capitalismo. São Paulo: Martins Fontes, 2009.

BRÖCKLING, Ulrich. Das unternemerische Selbst. Frankfurt: Suhrkamp, 2007.

DEJOURS, Christophe. A banalização da injustiça social. 7ª Ed. Rio de Janeiro: FGV, 2006.

EHRENBERG, Alain. Das erschöpfte Selbst. Frankfurt: Campus, 2015.

FROMM, Erich. Psicanálise da sociedade contemporânea. 6ª Ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1970.

MACIEL, Fabrício (Org.) A ficção meritocrática. Executivos brasileiros e o novo capitalismo. E-Book. Campos dos Goytacazes: EdUENF, 2022.

SENNETT, Richard. A corrosão do caráter. 16ª Ed. Rio de janeiro: Record, 2015.


Capitalism and mental health

 

Good Afternoon! First of all, I'd like to thank our dear friends Uwe Bittlingmayer and Luis Saboga for inviting me to participate in the Helica program again. Last year, we gave a presentation that was very productive and left me very excited. On this new occasion, I will try to continue the discussion raised at that time, with new insights and provocations. Here I will try, in a simple and objective way, to present a sociological contribution to thinking about the issue of mental health in contemporary times. This contribution will be based on my reflections and empirical research in recent times.

To this end, a critical theory of capitalism cannot shy away from dialogues between its great interpreters. That's why I'd like to sketch out an initial confrontation between two great authors who have greatly influenced me, one classic and the other contemporary. I'm talking about the Frankfurt psychoanalyst Erich Fromm and the French psychiatrist and psychoanalyst Christophe Dejours, the father of contemporary studies on the psychopathology of work. Overall, I will try to show how contemporary capitalism is a social, economic and political system designed to produce mental insanity on a collective scale. To this end, I have selected two key works by these authors, which I consider vital for a socio-cultural understanding of contemporary capitalism and its fundamental pathologies. These are Fromm's The Sane Society (1955) and Dejours' Souffrance en France: banalisation de l'injustice sociale (1998).

My interest in these authors and these works is no coincidence. In recent years, I have carried out extensive theoretical and empirical research with executives in Brazil. My initial idea was to try to map the class origin, lifestyle and political positioning of these executives. Over time, we found that they were a Brazilian "upper middle class", with a privileged social background, a lifestyle marked by a deeply meritocratic mentality and an extremely conservative political stance, given the serious class inequality in Brazil. This scenario led me to define a "corporate habitus" as the central concept for mapping out my interviewees' ways of thinking, acting and feeling. The main product of this research was the E-book entitled A ficção meritocrática: executivos brasileiros e o novo capitalismo (The meritocratic fiction: Brazilian executives and the new capitalism) (Maciel, 2022), in which we present the general results we found.

Faced with these results, and especially after reading Erich Fromm's work, I began to wonder, beyond the habitus, what kind of self is predominant among people who, having been privileged from birth, still cling strongly to a deeply meritocratic mentality. In this regard, the German sociologist Ulrich Bröckling (2007) offers some interesting clues with his concept of the "entrepreneurial self". One of the aspects that struck me most in this research, beyond the obvious socio-economic dimensions, was precisely the human condition of the executives. There is evidently a prevailing malaise among them. This is an intriguing issue, as we are dealing here with individuals who are the main winners in the corporate world and in capitalism as a whole. Theoretically, they should be the happiest and most fulfilled people. This doesn't seem to be exactly the situation.

For example, we found that executives are seen as and internalize a condition of "supermen", who need to withstand pressure, not show weakness and be an example to their subordinates. Here we are talking about specific aspects related to the theme of a psychopathology of work, which Dejours has explored in depth. In this sense, I have come to understand that executives are the main "structuring structures" and "structured structures" of contemporary capitalism, in other words, its main support for reproduction, if we use Pierre Bourdieu's language. We can see a direct connection with the role they play in the construction and legitimization of social domination in today's capitalism. It therefore seems urgent to me to mobilize the works of psychoanalysts such as Fromm and Dejours. It is no coincidence that the role of executives in the construction of the "pathology of normality" (Fromm, 1970) is something that has been perceived as fundamental in the work of both authors.

Because of this, we can outline a dialog between what I would like to call a "philosophical anthropology" of contemporary capitalism, in Fromm's work, and a practical theory of current social domination, in Dejours' work. With this, I intend to outline a cultural critique of social domination in today's societies. In this context, I understand culture differently in both authors. In Fromm's work, we find a much more cultural than economic analysis of life in capitalist societies. It is in this sense that he "psychologizes" Marx's concept of alienation, thereby going beyond Freud. For Fromm, alienation is not just false consciousness or conditioned by our primitive instincts, but is determined especially by social and cultural existence in capitalism.

It's no coincidence that his concept of "social character" seeks to map out exactly the predominant human type in contemporary capitalist culture, which is imposed on each and every one of us. Based on our research, we can say that the predominant social character in today's capitalism is ultra-meritocratic, which became clear in several of our interviewees' statements. In this sense, the work of Richard Sennett (2015), with his idea of the "corrosion of character", is very pertinent. With this concept, the author seeks to thematize the inability of individuals to build solidarity and lasting bonds in what he calls the "new capitalism". What we found in our research was nothing short of exacerbated individualism and an almost religious belief in meritocracy. This reality erodes the character of the contemporary corporate self and, at the same time, generalizes it as the social character required of society as a whole, if we consider the systemic influence that the corporate world exerts on all social interactions.

Returning to Fromm, his central idea of the pathology of normality is of profound importance for understanding contemporary social domination. For the author, modern societies as a whole are not healthy, so it's not simply a question of individual pathologies, but collective ones. What we found in our research is that the corporate world, through its executives, constructs and imposes almost unattainable moral and cultural goals on all individuals, causing stress, depression and malaise in all social strata. For this reflection, an excellent book by the Frenchman Alain Ehrenberg is called Das erschöpfte Selbst (The exhausted self) (2015), where not by chance he dialogues with the Frankfurtian Axel Honneth, who has taken up the theme of social pathologies in recent capitalism in his work.

However, Fromm's analysis of the culture of capitalism remains on a rather abstract level, lacking empirical findings in many respects. This is where the extremely important work of Christophe Dejours comes in as a complement. The author has been building the fields of psychodynamics and psychopathology of work in France for many years. His central issue is the way in which suffering and fear become a naturalized rule in working relationships as a whole. The author notices a considerable increase in the acceptance of social injustice in France in the 1990s, which he defines as the "trivialization of evil", adapting Hannah Arendt's classic analysis of fascism. However, Dejours is not dealing with the visible trivialization of evil in authoritarian relations mediated by the state, but with this kind of invisible trivialization in the daily life of work relations. In short, it is the naturalization of inequality at a deep level.

In this sense, the author presents us with a "practical theory" on the pathology of normality, allowing us to see how large companies have developed a real culture of fear and suffering, which is fundamental to the practice of social domination and the reproduction of inequality. We are talking here about threats, psychological terrorism, humiliation and disrespect on a daily basis, which gradually undermine people's mental health. Here, we can understand culture in a practical sense, similar to the sense used by Richard Sennett in his analysis of the "culture of the new capitalism", marked by the ideology of flexibility and teamwork. What Dejours shows us is the exact opposite of this ideology. Everyday life in the corporate world is marked by the naturalization of suffering and fear, both on the part of those who inflict it and those who are affected. Naturally, the damage is much greater for those at the bottom of the work hierarchy, who are marked by a daily routine of aggression and symbolic violence that is objectively somatized in their bodies.

For the author, a central question in this regard is to understand how ordinary people, or "good citizens", can be conniving and complicit in forms of injustice that were unacceptable in France in previous periods. In Brazil, the acceptance of social injustice has always been part of our history, considering our deep structural inequality between classes. A strong example of the trivialization of social injustice, as defined by Dejours, can be seen in the corporate crimes committed in Mariana and Brumadinho, euphemistically treated by the media as "environmental disasters".

When some of the top executives at Vale and Tüv Süd, the German consultancy firm responsible for the safety reports and opinions on the Brumadinho case, were indicted for intentional crime by the Minas Gerais Public Prosecutor's Office, the two companies tried to dissociate their image from the crime in question. This is a serious acceptance of injustice and the trivialization of evil.

For Dejours, it's about "tolerating the intolerable" and building the capacity to accept the "dirty work" often done by top executives, who should be held accountable. On the other hand, when we talk about these issues with our interviewees, they don't talk back, presenting a decorated discourse from the corporate world in defense of the positive role of companies in society. In doing so, they construct an ideal of capitalism that is good, politically correct, inclusive and sustainable, in a process of legitimizing and justifying the "new spirit of capitalism", as Luc Boltanski and Eve Chiapello (2009) have beautifully analyzed.

In practice, once again, Dejours explains that this construction of a big lie in the corporate world is only possible through what he defines as a "strategy of communicational distortion", which comes from the top of companies and is passed on to all their employees. In other words, within companies a discourse is always constructed that best preserves their identity, which almost never corresponds to reality. This strategy is also defined by Dejours as the "rationalization of evil".

With this in mind, the necessary exercise we need to do, based on the ideas of Fromm and Dejours, is to denaturalize the trivialization of evil in contemporary capitalism. This is an indispensable step towards building healthy societies, as Fromm would say. To do this, we need to understand that the trivialization of evil is secular and part of our everyday life. Its construction and legitimization depends directly on what, in my research, I defined as an "ultra-meritocratic morality" defended and lived in practice by executives.

They are presented to society as examples of success, performance and honesty, which hides the involvement of several of them in cases of corruption and business crime. In addition, ultra-meritocratic morality is one of the key aspects supporting the rise of the far right in several countries around the world, including Brazil. Just look at the deeply meritocratic speeches of Donald Trump and Jair Bolsonaro, among others. In this way, deconstructing this entire moral and ideological backdrop is fundamental to building healthy societies, as Erich Fromm dreamed of in his humanist utopia, beyond the pathologies of normality.

 

Bibliography

BOLTANSKI, Luc; CHIAPELLO, Éve. The new spirit of capitalism. São Paulo: Martins Fontes, 2009.

BRÖCKLING, Ulrich. Das unternemerische Selbst. Frankfurt: Suhrkamp, 2007.

DEJOURS, Christophe. The banalization of social injustice. 7th Ed. Rio de Janeiro: FGV, 2006.

EHRENBERG, Alain. Das erschöpfte Selbst. Frankfurt: Campus, 2015.

FROMM, Erich. Psychoanalysis of contemporary society. 6th Ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1970.

MACIEL, Fabrício (Org.) The meritocratic fiction. Brazilian executives and the new capitalism. E-Book. Campos dos Goytacazes: EdUENF, 2022.

SENNETT, Richard. The corrosion of character. 16th Ed. Rio de Janeiro: Record, 2015.

 

 
 
 

Comments


Todos os Direitos Reservados | NUESDE @2023

CNPq.png
Prancheta 1.png
Prancheta 3.png
Prancheta 2.png
NUESDE_Prancheta 1-01.png
bottom of page